Álvaro Ribeiro Regiani e Kenia Gusmão Medeiros


A UTOPIA NA POLÍTICA DE MORUS E POLÍTICA SEM UTOPIA DOS TUPINAMBÁS


Em 1516, Thomas Morus [1478 – 1535] publicava em latim a sátira “Utopia” em Lovaina [Flandres]. O livro descrevia uma fantástica ilha atlântica onde viviam homens racionais em perfeita harmonia social e ironizava a política e a moral da Inglaterra renascentista. O nome da ilha Utopia seria homônima ao do rei fundador Utopos que do grego seria a junção do prefixo “U” [sem] com o substantivo “topos” [lugar] que significa “sem-lugar” ou em outra acepção, “eu” [bom] e “topos”, “bom lugar”. O parâmetro entre a ficção e a realidade confundiam-se através de reflexões filosóficas sobre os vícios dos homens que eram tidos pelo escritor londrino como as raízes dos problemas sociais do reino, em particular a avareza e a cobiça.

Para Thomas Morus, a fome dos mais pobres levava ao roubo por ser tanto de um apelo para sobrevivência quanto da cobiça. Mas, o vício dos mais pobres só existia por conta de outro vício, a avareza dos mais ricos que gerava a injustiça social. Nas considerações de Morus, o rei em vez de solucionar esses problemas, deixava os nobres aplicarem punições severas para manter a ordem: “A punição do roubo com a pena de morte vai muito além da demanda por justiça, e não atende, de forma alguma, o interesse público” [MORUS, 2004, p. 13].

Com o objetivo de romper com esse ciclo vicioso, Morus propôs uma medida entre a cobiça e a avareza, a vida em comum:  “Em Utopia, onde tudo é comum a todos” e “embora ninguém tenha nada de seu, todos são ricos” [MORUS, 2004, p. 127]. Morus havia sido advogado de comerciantes londrinos e atuou contra a nova estrutura fundiária dos cercamentos [enclousers] que transformou terras cultivadas com cereais em pastagens para aumentar as exportações de lã da Inglaterra. Em 1515, um ano antes da publicação da Utopia, ele foi enviado a Flandres como Vice-xerife da Coroa para negociar o litígio com o príncipe de Castela [1500 - 1558]. Carlos V, futuro rei da Espanha herdou os Países Baixos e proibiu a Holanda de importar a lã da corte de Henrique VIII [1491 - 1547]. O novo regime de produção e a crise entre as coroas transformou a economia tradicional com o aumento das horas de trabalho para alguns e a ausência de trabalho para outros, o que acentuou as disputas sociais e agravou a fome. Tal qual Morus denunciou em a Utopia:

“Derrubam casas, destroem aldeias e, se poupam as igrejas é, provavelmente, porque servem de estábulos a seus carneiros. Essas excelentes pessoas transformam em deserto as habitações, e tudo que era cultivado; como se as florestas e as terras reservadas à caça já não prejudicassem bastante a agricultura” [MORUS, 2004, p. 17].

Sabe-se que o livro II da Utopia foi escrito durante essas negociações em Flandres e a redação do livro I aconteceu durante o regresso de Thomas Morus a Londres. Em ambas as partes, os vícios que levavam a fome dos mais pobres o influenciou a “tentar reduzir a pobreza fazendo a riqueza recuar a patamares compatíveis com os de uma sociedade fraterna” [LOPES, 2011, p. 67]. Mas, para ter o efeito de realidade, ele partia da “verificabilidade daquilo que havia sido encontrado e observado” [KOSELLECK, 2014, p. 124] através dos relatos do mareante Américo Vespúcio [1454 – 1512].

Segundo os relatos do mareante Américo Vespúcio, os antípodas da costa atlântica, os Tupinambás não partilhavam dos vícios, fronteiras e reinos como os europeus: “Não possuem entre si bens próprios porque tudo é comum. Não têm fronteiras de reinos ou província; não têm rei nem obedecem a ninguém; cada um é senhor de si. Não administram justiça, que não é necessária para eles, porque neles não reina a cobiça” [VESPÚCIO, S.D, p. 81]. A vida em comum dos Tupinambás brasileiros poderia, certamente, oferecer a Morus um exemplo de comunidade possível. Contudo, ao que tudo indica a Utopia não foi escrita a partir dos antípodas do novo mundo. Mas, por que?

Uma hipótese provável seria que Morus partilhava da percepção recente dos europeus sobre os povos da orbis alterius. Os Tupinambás eram imaginados e retratados em uma vida comunitária, mas de forma exótica e isolada da política e da moral o que impedia uma filosofia. Conforme representado na xilogravura em madeira que circulou na Europa a partir de 1505, de autoria anônima, mas claramente inspirada nos relatos de Vespúcio:



EAMES, 2012, p. 6

No lado direito da xilogravura é possível observar a antropofagia ritual como uma representação da “essência” comunitária dos Tupinambás, conforme se lê na legenda: “eles não tem propriedade privada, porque todas as coisas são em comum”, mas na frase abaixo, “eles comem uns aos outros, e aqueles que eles matam são comidos, pois a carne humana é um alimento comum” [EAMENS, 1922, p. 7]. Impressões como esta foram comuns em outros relatos de mareantes que circularam no século XVI, profundamente eurocêntricas, reduziam a constituição social dos Tupinambás a vários esteriótipos, como as suas supostas condições pré-políticas ou pré-morais.
Nos termos da moralidade pretendida por Morus, não foi a descrição de povos antípodas ou das riquezas advinda do além-mar que influenciou sua escrita e sim o significado que a viagem de Vespúcio trouxe, o rompimento da concepção unitária do cristianismo. A unidade geográfica católica, a orbis terrarum, seria uma a Ilha-Terra formada pela Europa, a Ásia e a África destinada por Deus aos homens e nada mais podeira existir fora dela. Mas com as viagens de Vespúcio se “achou” um “mundo novo”, a orbis alterius: “admitidos pelos pagãos, mas não aceito por autores cristãos, pois podia implicar uma inaceitável e herética pluralidade de mundos” [O’GORMAN, 1992, p. 161].

Morus, como um defensor do humanismo, fazia várias objeções a moral unitária católica e se valia da noção de pluralidade de mundos em seu diálogo com o paganismo clássico. Rafael Hitlodeu, a principal personagem de Utopia, foi membro da expedição de Vespúcio e “navegou, é verdade, mas não à moda de um Palinuro, e sim como um outro Ulisses, ou mesmo como um Platão” [MORUS, 2004, p. 5]. Depreende-se que a filosofia greco-latina foi a verdadeira prova que a Utopia era possível para o autor, pois ele ao assumir o ideal platônico como modelo, “para quem queira vê-la” [PLATÃO, 2006, p. 379 5992b] assumiu que “devo confessar que há muita coisa na República de Utopia que eu desejaria ver imitada em nossas cidades - coisa que mais desejo do que espero” [MORUS, 2004, pp. 131-132].

Rafael Hitlodeu se situava entre o mítico mareante Ulisses que fez todo tipo de peripécia para retornar a Ática para ocupar novamente seu trono e do celebre filósofo grego que escreveu o diálogo a República como crítica a Atenas democrática e imperialista do século V a.C. Mas, Hitlodeu não era Palinuro que navegou somente nos sonhos, ele poderia como Ulisses regressar ao seu mundo e mudá-lo como Platão intentou fazer.

Muito embora o nome do herói de Morus significasse “idiota”, a palavra Hidloteu deriva do radical grego “idion” que significava na língua inglesa pessoa leiga e sem habilidade profissional, mas como lembrou Hannah Arendt por meio das interpretações de Werner Jaeger: “O surgimento da cidade-estado significava que o homem recebera além de sua vida privada, uma espécie de segunda vida, o seu bios politikos [vida política]. Agora cada cidadão pertence a suas ordens de existência; e há uma grande diferença em sua vida entre aquilo que lhe é próprio [idion] e o que é comum [koinon] [ARENDT, 2007, p. 33].

A filocracia desejada por Platão, decisivamente, influenciou Morus na elaboração de sua oikouméne [a casa em comum] na busca por um rei filósofo que arbitraria sobre a justiça. Através do trocadilho com o nome do atual rei da ilha Utopia, Ademos que significava rei sem povo, ele buscava exemplificar a possibilidade do cidadão de participar de “uma atitude racional comandada pelo saber” [BORGES, 2011, p. 52]. O monarca utópico deveria estar a serviço da sociedade, com os súditos no centro da discussão política e moral, em vez de delegar essa função a terceiros. Para assim retomar o que Platão aludiu: “É que, quando habituados, vereis mil vezes melhor que os de lá e, quando cada uma das imagens, reconhecereis o que ela é e de que coisa é sombra, porque já tereis a visão da verdade a respeito das coisas belas, justas e boas” [PLATÃO, 2006, p. 275 520c]

A filosofia platônica, ora velada ora explícita, não foi a única fonte de inspiração para Morus, a sátira clássica como meio para revelar a verdade através do humor definia os elementos críticos da Utopia. Michèle Madonna-Desabazeille interpretou que a escrita “oblíqua” de Morus situada entre a verosimilhança e a ironia permita um questionamento racional sobre os vícios e a corrupção dos governantes de seu tempo [MADONNA-DESBAZEILLE, 2008, p. 251]. Por isso a escolha da sátira como tropos linguístico não foi somente um recurso estilístico e sim uma opção igualmente política para apresentar de forma sutil o que ele censurava na Inglaterra, sem sofrer sansões.

Na companhia de seu amigo Erasmo de Roterdã, Morus traduziu diversos textos do escritor sátiro Luciano de Samóstosa [125-181 d.C.]. No livro “História verdadeira”, Luciano debochava dos vícios políticos, inclusive de tudo que tinha sido feito ou dito e declarava como “mentiras variadas de maneira convincente e verossímil, mas que também cada uma das coisas relatadas alude não sem comicidade a alguns dos antigos poetas, historiadores e filósofos que muitas coisas prodigiosas e fabulosas escreveram” [LUCIANO. In. SANO, 2008, p. 6].

Luciano que se apresenta como narrador de sua história verdadeira relata a sua descoberta da ilha Nuvem-Cucolândia, imaginada séculos antes pelo comediógrafo Aristófanes [447-385 a.C] na peça “As Aves”. Após o seu retorno da Lua, Luciano diz: “eu me lembrei do poeta Aristófanes, homem sábio e sincero que, sem ser acreditado, escreveu sobre eles em vão” [LUCIANO. In. SANO, 2008, p. 16]. Na peça de Aristófanes, as personagens Pisetero e Evélpides, cansados da vida pública de Atenas viajam mais de cem quilômetros em busca de Tereu, homem transformado em pássaro pelos deuses e descobrem um lugar tranquilo [topós aprágmon] entre os pássaros que lhes oferecem saúde, juventude e fartura. Ou seja, uma “eutopia”.

No desenrolar da comédia na Nuvem-Cucolândia ocorria uma disputa entre os deuses e os animais: “Conta-se que, entrincheiradas nessa fortaleza, as aves proclamaram-se soberanas do mundo e usaram as muralhas como uma barreira para impedir que os sacrifícios oferecidos pelos homens chegassem aos céus, submetendo os deuses pela fome” [MANGUEL; GUADALUPI, 2009, p. 309]. A postura antirreligiosa de Aristófanes valorizava uma forma mais humana de sabedoria que contrariava à “loucura mística” de sua época [VERNANT: VIDAL-NAQUET, 2005, p. 337]. Postura igualmente encontrada em Morus que distinguia a religião da moral, em sua sátira, quando o rei Utopos mandou separar a ilha do continente, transformou a antiga cidade de Abraxa em Utopia. Com isso, segundo Michèle Madonna-Desabazeille, “Deus foi excluído da criação da ilha, decisão humana, do rei Utopos”. Para o humanista Morus a restituição da ação humana racional sendo divergente da função que “elimina qualquer questionamento” do mito ou da religião, o levou a “introdução da crítica” sobre a religião, mas não da moralidade [MADONNA-DESBAZEILLE, 2008, pp. 251-252].

Em Aristófanes, Luciano e Morus as ilhas imaginárias serviram como espaços de intermediação entre os deuses e os homens. Mas, essas ilhas eram protegidas e não separadas do mundo exterior, assim a moralidade como uma instância normativa que antecede as leis servia como conduta cidadã. Morus que se apropriou dos meios, aparentemente, desinteressados da vida política contidos nas duas comédias quis em sua Utopia tornar os homens melhores adequando-os a uma nova moral pública. Na interpretação do historiador Russel Jacoby, essas ilhas “tempera a sua seriedade com piadas e comédia, uma tática recorrente na literatura utópica. A paródia anuncia a seriedade” [JACOBY, 2007, p. 77].

A seriedade da Utopia seria encontrada na formulação da vida comunitária platônica para a unidade necessária contra a pobreza, pois: “nela haverá duas cidades mutuamente antagônicas, a dos pobres e a dos ricos e em cada uma delas muitas outras” [PLATÃO, 2006, pp. 135-136 422a; 432a]. Morus, para superar o abismo entre as ‘duas cidades’ propôs um equilíbrio entre o trabalho e o lazer: “Pensais, talvez, que trabalhos diários de apenas seis horas seriam insuficientes para prover as necessidades. Longe disso, essa jornada de trabalho é suficiente o bastante para se produzir não apenas os bens necessários à vida, mas também aqueles que dão conforto e prazer à existência”  [MORUS, 2004, p. 58].

Interpreta-se que a Utopia representava um duplo retorno, tanto a vida política ao modo clássico [em que a liberdade seria definida pela cidadania] quanto o binômio trabalho-lazer como meio moralizador da vida comunitária. Morus pretendia com seu dialogo com a antiguidade e as Referências a viagem de Vespúcio ofertar um caminho para que os homens exercitassem a razão e o respeito ao interesse comum através de um “pensamento da política sem Estado e não desconhecimento do político” [MADONNA-DESBAZEILLE, 2008, p. 251]. Mas, se os interesses de Morus fossem, como contemporaneamente se diz, etnográfico, ele encontraria um outro exemplo verificável, mais próximo de sua Utopia. Anos depois da publicação da Utopia de Morus, Jean de Léry fez uma viagem para o Brasil em 1556 e relatou em sua Viagem à terra do Brasil [1578]:

“Os selvagens são grandes discursadores e costumam ir em qualquer assunto até o fim, por isso perguntou-me de novo: e quando morrem para quem fica o que deixam? — Para seus filhos se os têm, respondi; na falta destes para os irmãos ou parentes mais próximos. — Na verdade, continuou o velho, que, como vereis, não era nenhum tolo, agora vejo que vós outros maírs [franceses] sois grandes loucos, pois atravessais o mar e sofreis grandes incômodos, como dizeis quando aqui chegais, e trabalhais tanto para amontoar riquezas para vossos filhos ou para aqueles que vos sobrevivem! Não será a terra que vos nutriu suficiente para alimentá-los também? Temos pais, mães e filhos a quem amamos; mas estamos certos de que depois da nossa morte a terra que nos nutriu também os nutrirá, por isso descansamos sem maiores cuidados” [LÉRY, 1961, p. 135].

A ordem social dos Tupinambás representada por Léry, indicava a tolice em trabalhar para a acumulação de riquezas, sendo um excesso inútil porque a Terra em comum daria a abundância necessária para se evitar, por exemplo a fome. Segundo o antropólogo Pierre Clastres os Tupinambás produziam para os outros sem o “desejo de posse que é de fato desejo de poder. A sociedade primitiva, primeira sociedade de abundância, não deixa nenhum espaço para o desejo de superabundância” [CLASTRES, 2003, p. 222].

Os Tupinambás, assim como outras sociedades ameríndias, trabalhavam diariamente menos que quatro horas por dia em uma “quase completa ociosidade” para se dedicarem a caça, pesca, festas e a guerra em constantes atividades para impedir que a sua economia, chamada de subsistência, não se torna-se política [CLASTRES, 2002, p. 212]. Mas, isto não significava que não houvesse a política e sim que a forma política dos Tupinambás impedia o surgimento da propriedade privada por sua recusa “em se deixarem tragar pelo trabalho e pela produção, através da decisão de limitar os estoques às necessidades sociopolíticas, da impossibilidade intrínseca da concorrência”, pois, “de que serviria, numa sociedade primitiva, ser um rico entre pobres?” [CLASTRES, 2002, p. 216]

Viviam em comunidade solidária interpretou Darcy Ribeiro, mas não em uma utopia, pelo menos não nos moldes que Morus idealizou. O que o filósofo londrino queria era reformar a monarquia pela educação moral do rei, tal qual Platão tentou fazer com o tirano de Siracusa. O que para ambos não acabou dando muito certo, Platão foi escravizado por anos e Morus foi executado por rejeitar a sucessão de Ana Bolena como rainha. O que diferia, substancialmente, a Utopia de Morus da vida comunitária dos Tupinambás era a função da chefia indígena e do riso, tal qual Darcy Ribeiro relatou em memórias sobre a generosidade que ilustra parte da estrutura política:

“Como não recordar, também, a generosidade de meus amigos índios, sempre mais predispostos a dar que a guardar? Lá, ninguém manda jamais em ninguém. No máximo, um cabeça da família, exercendo discreta liderança, sugere que talvez seja bom fazer, agora, tal ou qual coisa. Alguém pode até querer mandar, mas nunca será obedecido. Rirão dele” [RIBEIRO, 2010, p. 29].

O riso ao contrário da sátira de Morus, tinha outra função de desautorizar a dominação de um possível “tirano”. A liderança Tupinambá não era hereditária e sua autoridade política era provisória, o escolhido era para liderar o grupo em tempos de guerra por conta de suas habilidades de caça e de oratória. O ethos guerreiro que a liderança Tupinambá deveria representar se aliava ao dom da palavra para resolver disputas internas quando existiam. Pois, como documentou Pierre Clastres: “O chefe está a serviço da sociedade, é a sociedade em si mesma – verdadeiro lugar do poder – que exerce como tal sua autoridade sobre o chefe” [CLASTRES, 2002, p. 224].

Embora as ideias de Morus possam contemporaneamente ser considerada como uma utopia escapista, no século XX o filósofo Ernst Bloch compreendeu que esta incompletude, o “ainda-não ser”, levaria a humanidade a seguir em frente em uma “consciência antecipadora” que refletiria uma nova ontologia [BLOCH, 2005, p. 14]. Em outra acepção, o devir utópico foi apresentado como um entre-lugar temporal, um “aqui-agora”, como abordaram Gilles Deleuze e Félix Guattari: “É sempre com a utopia que a filosofia se torna política (…). A utopia não se separa do movimento infinito: ela designa etimologicamente a desterritorialização”[DELEUZE; GUATTARI, 2007, p. 130].

Nos termos apresentados a “consciência antecipadora” e a “desterritorialização” projetam o mesmo desejo de transformar a filosofia em política, algo que Thomas Morus compreendeu de forma incipiente. Contudo, desde 1500, a política sem utopia dos Tupinambás e de tantos outras nações ameríndias resiste, mesmo com alguns percalços, em uma luta comunitária contra o Estado.

Referências
Álvaro Ribeiro Regiani é mestre em história pela Universidade de Brasília, doutorando em história pela Universidade Federal de Goiás e professor de História da América na UEG – Campus Formosa. Membro pesquisador do GPETEC – Grupo de pesquisa em imagens técnicas.
Kênia Gusmão Medeiros é doutora em história pela Universidade Federal de Goiás e professora de História no Instituto Federal Goiano. Membro pesquisador do GPETEC – Grupo de pesquisa em imagens técnicas.

ARENDT, Hannah. A condição humana. Tradução Roberto raposo, posfácio Celso Lafer. 10ed. Rio de Janeiro: Forense universitária, 2007.
BLOCH, Ernst. O princípio da esperança, Vol 1. Rio de Janeiro, Editora UERJ: Editora Contraponto, 2005.
BORGES, Célia Maia. Utopias e profecias na Europa moderna. In. LOPES, Marcos Antônio & MOSCATELI, Renato. Histórias de países imaginários: Variedades dos lugares utópicos. Londrina: Eduel, 2011.
CLASTRES, Pierre. A sociedade contra o Estado: Pesquisas de antropologia política.Tradução Theo Santiago. São Paulo: Cosac & Naify, 2003.
DELEUZE, Gilles & GUATTARI, Félix. O que é filosofia? Rio de Janeiro: Ed. 34, 2007.
EAMES, Wilberforce. Descripition of a Wood Engraving Ilustrating the South American Indians (1505). New York: The New York Public Library, 1922. Disponível em https://archive.org/details/descriptionofwoo00eame_0/page/6/mode/2up acessado em 25 de fev. de 2020.
JACOBY, Russel. Imagem imperfeita: pensamento utópico para uma época antiutópica. Tradução Carolina de Melo Bomfim Araújo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007.
KOSELLECK, Reinhart. Estratos do tempo: Estudo sobre história. Tradução Markus Hediger. Rio de Janeiro: Contraponto: PUC-Rio, 2014.
LÉRY, Jean de. Viagem à terra do Brasil. Tradução Sérgio Milliet. São Paulo: Editora Biblioteca do exército, 1961.
LOPES, Marcos Antônio. A melhor das utopias. In. LOPES, Marcos Antônio & MOSCATELI, Renato. Histórias de países imaginários: Variedades dos lugares utópicos. Londrina: Eduel, 2011.
MADONNA-DESBAZEILLE, Micheèle. Utopia. In. RIOT-SARCEY, Michèle; BOUCHET, Thomas & PICON, Antoine. Dicionário das utopias. Tradução Carla Bogalheiro Gamboa e Tiago Marques. Lisboa: Edições texto & grafia, 2008.
MANGUEL, Alberto: GUADALUPI, Gianni. Dicionário de lugares imaginários. Tradução de Pedro Maia Soares. São Paulo: Companhia das letras, 2009.
MORUS, Thomas. Utopia. Prefácio João Almino; Tradução Anah de Melo Franco. Brasília: Ed. UnB: IPRI, 2004.
O’GORMAN, Edmundo. A invenção da América: Reflexões a respeito da estrutura histórica do Novo Mundo e do sentido do seu devir. Tradução de Ana Maria Martinez Corrêa e Manoel Lelo Bellotto. São Paulo: Editora UNESP, 1992.
PLATÃO. A república. Tradução Anna Lia Amaral de Almeida Prado. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
RIBEIRO, Drcy. Meus índios, minha gente. Rio de Janeiro: Fundação Darcy Ribeiro; Brasília, DF: Editora UnB, 2010.
SANO, Luica. Das narrativas verdadeiras, de Luciano de Samósata: Traduções, notas e estudo. Dissertação de Mestrado. Programa de pós-graduação em letras clássicas. São Paulo: USP, 2008.
VERNANT, Jean-Pierre: VIDAL-NAQUET, Pierre. Mito e tragédia na Grécia antiga. São Paulo: Perspectiva, 2005.
VESPÚCIO, Américo. Novo Mundo. As cartas que batizaram a América. Rio de Janeiro: Fundação Darcy Ribeiro; Brasília, DF: Editora UnB, 2010.

8 comentários:

  1. Essa perspectiva dos Tupinambás de uma política sem utopia é deveras interessante, pois sabemos dos riscos das utopias que quiseram se "encarnar" na realidade. Como vocês vêm essa posição nos auxiliando no ensino de História?
    Leandro Mendanha e Silva

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    2. Obrigada, Leandro. Acredito que pode auxiliar no sentido de demonstrar aos estudantes outras teorias e epistemologias políticas, e outras visões de mundo, para além da base etnocentrista ainda presente em algumas práticas de ensino. Assim, discutir as noções políticas indígenas é uma prática decolonial.Obrigada, Leandro. Acredito que pode auxiliar no sentido de demonstrar aos estudantes outras teorias e epistemologias políticas, e outras visões de mundo, para além da base etnocentrista ainda presente em algumas práticas de ensino. Assim, discutir as noções políticas indígenas é uma prática decolonial.

      Kenia Gusmão Medeiros.

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    3. Muito obrigado pela pergunta Leandro Mendanha e Silva, de fato as utopias capitalistas como as prisões, as antigas cidades de operários das industrias [a exemplo a Fordlândia aqui no Brasil] e as utopias dos partidos comunistas em diversos países cometeram o mesmo erro. No meu entender a política sem utopia dos Tupinambás só foi possível graças a rejeição do poder do "um" em detrimento do múltiplo. Desse modo, não haveria vigilância do corpo, valorização da miséria pela economia e a autocracia do poder, por isso os Tupinambás, diferentemente de outras utopias não tinham esse nome como ideal a ser alcançado, mas viviam na prática esta experiência.

      Esta experiência política de uma comunidade sem a existência de uma unidade ou de unidades como a "lei", o "rei" ou a "fé" que impediam a multiplicidade podem auxiliar o ensino de história em duas situações: 1 - Que existem experiências políticas distintas no tempo e no espaço que não seguem uma lógica teleológica [Por exemplo, da tirania clássica a democracia liberal]; 2 - Que outras experiências políticas permitem uma outra forma de pensar e se conceber uma sociedade.

      Quem sabe uma nova sociedade conjugada com uma educação transformadora.

      Álvaro Ribeiro Regiani

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    4. Obrigado pelas respostas. Realmente é interessante pensar as questões que envolvem o múltiplo e o descentramento etnocêntrico. Parabéns para vocês.

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