Eloi Giovane Muchalovski


OS POVOS JÊ MERIDIONAIS NA AULA DE HISTÓRIA: TRAJETÓRIAS E POSSIBILIDADES


Amplamente debatida no meio acadêmico, a abordagem da história indígena na educação básica é um dos vários aspectos do currículo escolar que ainda carece de maior atenção, tanto por professores, que são os interlocutores entre a temática e o educando, quanto por produtores de conteúdo, os quais são responsáveis por coletar, selecionar e preparar o conjunto de conhecimentos que farão parte de cartilhas, livros didáticos e materiais digitais.

A partir da redemocratização do país no final dos anos 1980, e com a organização e mobilização do Movimento Indígena, iniciando a mais de uma década antes, pensou-se em criar mecanismos específicos para que o ensino sobre a cultura e história dos grupos autóctones tivesse maior espaço no ensino brasileiro. Oportunizava-se assim que os índios fossem reconhecidos, respeitados e protegidos, seja nas suas crenças, costumes e organização social, mas, sobretudo, quanto ao direito de posse das terras que tradicionalmente ocupavam. Ao menos isso é o que reza o caput do artigo 231 da Constituição de 1988. Nesse sentido, iniciou-se uma série de medidas que resultaram, muitos anos depois, na sanção da Lei 11.645/2008, a qual incluiu no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”.

Porém, passados mais de dez anos de aplicação de tal legislação, o que ainda se observa é um descompasso entre a produção historiográfica e o conteúdo pedagógico. Como bem observou Silva [2012, p. 77] ao analisar os livros didáticos, aos índios “normalmente lhes é reservado um espaço no ‘cenário do Descobrimento’ para depois desaparecerem e não retornarem mais à História”. Por outro lado, o mesmo efeito da redemocratização, e o posterior adensamento e aprimoramento dos programas de pós-graduação no país, possibilitaram um avolumar na produção de conhecimento acerca dos grupos indígenas. Avolumar que trouxe aprimoramentos teóricos e metodológicos, refletidos nas novas formas de se estudar e ver o protagonismo desses povos na História. Expoente desse caminho foi a edição da obra de Manuela Carneiro da Cunha, intitulada História dos Índios no Brasil, publicada em 1992 e que aglutinou múltiplas disciplinas das ciências humanas em um profundo estudo sobre diferentes povos indígenas.

Logo, o que neste breve texto se alvitra é a utilização dos resultados dessas novas pesquisas para a abordagem da história dos Jê Meridionais – formados pelos grupos indígenas Kaingang, Laklãnõ-Xokleng e Ngrokòthi-tõ-prèy-Xokleng –, os quais dominaram boa parte do Planalto Meridional durantes milhares de anos e foram considerados pela Coroa portuguesa os últimos índios bravios da então Colônia, motivando a reedição da “Guerra Justa” por meio da Carta Regia do Príncipe Regente D. João VI, em 1809.
A história deste grupo é desconhecida por boa parte dos profissionais de educação, configurando-se como uma das várias formas de exclusão das quais seus remanescentes são vítimas. Invisibilizados pela História, pelo poder público e, de certa forma, pela própria escola. À vista disso, e com o intuito de contribuir para a difusão de conhecimento e seu respetivo uso em sala de aula, abordar-se-á neste texto maneiras de ler a história indígena, mormente dos Kaingang e Xokleng, colocando-os como protagonistas do fazer historiográfico, bem como abordar-se-á aspectos teóricos considerados relevantes para o ensino da temática na educação formal.

Os Jê Meridionais, história e cultura
Apoiado em observações arqueológicas acerca da presença indígena na atual região oeste de Santa Catarina durante o século XVI, D’Angelis [1989, p. 268] identifica “como ocupação Kaingang a mata de Araucária e seus campos intermédios. E, como ocupação Xokleng, [...] os Campos de Lages, Curitibanos e Caçador e as matas de Araucárias a leste deles”. Contudo, a presença dos Jê Meridionais naquele território data entre 1.500 a 5.000 anos [MOTTA, 2017; SANTOS, 1987]. Apesar de compartilharem traços culturais homogêneos e por diversas vezes terem sido englobados em um único povo – os Biturunas –, Xokleng e Kaingang auto distinguem-se enquanto povo e mantiveram-se ao longo do tempo em constante mobilidade, muitas vezes travando acirrados conflitos interétnicos.

Dentre os Xokleng, houve, a partir da segunda metade do século XIX, uma cisão que os dividiu em três sub-grupos. Junto ao rio Hercílio na região de Ibirama localizavam-se os Laklanõ. No litoral de Santa Catarina, junto a serra do Tabuleiro até próximo a Serra Geral, estavam os Angying. Já os Ngrokòthi-tõ-prèy habitavam a atual região de fronteira entre o Paraná e Santa Catarina, próximo a União da Vitória[PR]. Das três facções, restam remanescentes de apenas de duas delas: a Laklanõ, formada por índios da reserva indígena de Ibirama[SC], e a Ngrokòthi-tõ-prèy que vivem na Terra Indígena de Rio dos Pardos, em Porto União[SC]. Desta última, pouco se sabe, pois diminutas são as pesquisas até aqui realizadas.

Considerados “vítimas” históricas da ação de bandeirantes, colonizadores e bugreiros [capangas contratados por particulares e pelo governo para perseguir e matar índios], os Jê Meridionais tiveram um inicial contato com não índios no século XVIII, e que intensificou-se a partir de meados do século XIX quando a contumaz ação de conquistadores acabou por pungir fragmentações já existentes entre os Kaingang. Contando com o apoio de vários caciques, que aceitaram aldear-se e aliar-se a não índios, estabeleceu-se uma guerra contra grupos que resistiam em aderir aos aldeamentos e impediam a expansão agropastoril em curso. Destaque para o líder indígena Vitorino Condá, que, aliando-se a grupos de fazendeiros e exploradores, empreendeu violentas ações contra facções de índios Kaingang e Xokleng considerados por ele inimigos.

Outros fatores decisivos para a conquista do território indígena no planalto foram: a] a abertura do caminho de tropas em 1728; b] a posterior introdução de fazendas e áreas de pastagens na região de Lages e Guarapuava; c] e o estabelecimento de imigrantes alemães em Rio Negro, em 1829. Tais ações enchoçaram, sistematicamente, os Jê Meridionais para os mais isolados grotões do planalto. Em contrapartida, a expansão colonizatória esbarou na resistência dos Xokleng aos aldeamentos e a consequente cessão de seu território. Tal atitude, levou a reedição de uma nova versão da “Guerra Justa” por D. João VI em 1809. Segundo Santos [1987, p. 77], “a guerra justa aos silvícolas era a válvula de escape para o branco cometer as maiores atrocidades”.

Uma primeira tentativa de “pacificação” dos Xokleng – chamados pejorativamente de bugres – ocorreu em 1875 por intermédio do sertanista Joaquim Francisco Lopes, o qual estabeleceu um posto de atração ao sul de Rio Negro, junto a Estrada de Tropas, nos Campos da Estiva, denominada Colônia Indígena São Tomaz de Papanduva. Sem êxito nos seus objetivos e devido a falta de verbas para sua manutenção, o posto foi extinto dois anos depois. Somente 37 anos mais tarde é que uma nova tentativa foi posta em prática, desta vez pela ação do recém-criado SPILTN [Serviço de Proteção aos Índios e Localização de Trabalhadores Nacionais]. Por intermédio de um jovem de 17 anos, chamado Eduardo de Lima e Silva Hoerhann, houve o primeiro contato oficial pacífico de um não índio com o subgrupo Laklanõ, próximo a região do rio Plate. No mesmo ano, 1914, os sertanistas João Pereira Gomes e Fioravante Esperança, também funcionários do SPILTN, implantaram o Posto Barra Bonita e estabeleceram contato com o subgrupo Ngrokòthi-tõ-prèy, próximo a União da Vitória, na bacia do rio Jangada.

É salutar, todavia, enfatizar que a história dos Jê Meridionais não resume-se à esfera do contato com o “homem branco”. Se faz necessário compreendê-los como agentes de sua própria história, pois, apesar de constituírem-se de um povo ágrafo, um conjunto de memórias, tradições e crenças expõe aspectos valorosos para o entendimento da sua estrutura social, cultural e religiosa. A sociedade Kaingang, exempli gratia, é determinada por princípios sociocosmológicos dualistas, ou seja, a estrutura social é defina em metades, chamadas por eles de Kamé e Kairu, que são na verdade os heróis culturais que perpassam toda a divisão do mundo kaingang. Desta forma, por meio de uma explicação simplista para apresentar um arranjo sociocultural complexo, pode-se sintetizar que, na concepção e organização desses indígenas, tudo divide-se em duas partes. Se o Sol é Kamé a Lua é Kairu, se o pinheiro é Kamé o cedro é Kairu, se o lagarto é Kamé o macaco é Kairu, e assim por diante [TOMMASINO; FERNANDES, 2001]. Tal divisão não é apenas representativa na organização material, mas é também mecanismo de distinção entre os membros do grupo. Nessa concepção, toda a esfera de parentesco segue determinações baseadas no dualismo. Um membro Kamé, por exemplo, somente poderia casar com um Kairu. O filho, fruto de tal união, passava, por regra, a integrar a metade da qual pai pertenceria. Atualmente, boa parte do tradicional arranjo social kaingang ainda persiste, sobretudo no que tange as regras de descendência, residência, produção econômica e autoridade política.

Quanto a organização social dos Xokleng, Jules Henry, que conviveu com o grupo por pouco mais de um ano, observou que “êles não têm nenhum sistema de clãs ou metades que lhes imponham obrigações sociais [...]e são um povo sem senso de formação social” [HENRY, apud SANTOS, 1987, p. 219]. No entanto, estudos posteriores ao de Henry apontam para a existência de cinco grupos exogâmicos no arranjo social, distinguidos através de pinturas corporais [WIIK, 1999; SANTOS, 1987]. Acreditavam em espíritos e fantasmas que poderiam impor malefícios e benefícios, especialmente durante caçadas. Todo animal possuía um espírito guia, assim como um ser humano poderia tê-lo, adquirido quando colocado no ventre de uma mulher e surgido em forma de criança através do nascimento. Praticavam tanto a monogamia quanto a poliginia e a poliandria. Porém, após o contato sistemático com não índios, pouco restou da tradicional cosmologia xokleng. Nômades por excelência, hoje estão divididos em duas terras indígenas, formadas por cerca de nove aldeias, sobrevivendo de pequeno comércio de manufatura ou como mão de obra sazonal. Quando aos aspectos mitológicos, estes foram praticamente todos suprimidos, substituídos pela grande adesão de seus membros à prática evangélica.

História indígena na sala de aula
Conforme bem observou Brighenti [2012], estes índios “continuam escrevendo sua história, através da luta por direitos territoriais e educacionais, por políticas públicas de saúde e assistência, pela manutenção da língua e dos mitos recriados cotidianamente”. Portanto, não é razoável que se continue a tratar da história indígena como um tópico nos estudos do Período Colonial, ou como elemento alegórico inserido no todo da história do Brasil. É eminente que se avance em políticas públicas e ações individualizadas para que não se silencie estes importantes agentes da sociedade.

Especificamente quanto aos Jê Meridionais, e na região que outrora foi dominada por estes povos, é possível, mesmo com a dilatada, porém insuficiente, produção científica atual, que empreenda-se ações no objetivo de dar-lhes visibilidade histórica. Nesse sentido, observa-se quatro aspectos notáveis para tal empreendimento, bem como apresenta-se possibilidades de abordagens que podem refletir positivamente na ampliação do conhecimento histórico na educação básica.

Em primeiro lugar, é necessário vencer a barreira do preconceito. Os povos indígenas, mesmo tendo habitado um vasto território que hoje convencionamos chamar de país, parecem constituírem-se de seres alienígenas que aqui surgiram e não estabeleceram qualquer relação com o mundo em que vivem. Ora, se a sociedade não consegue vê-los como membros do arranjo social, se não conhece e respeita suas diferenças, e se nega seu passado através de discursos discriminatórios, os considerando “cada vez mais um ser humano igual aos demais”, por exemplo, dificilmente permitirá que alcancem os objetivos pretendidos pela constituinte de 1987. A educação, portanto, pode e deve ser ponto de partida para mudar esse cenário. Trabalhar em sala de aula a diversidade étnica do Brasil, demonstrando a importância ao respeito às diferenças e a necessidade de proteção das minorias, é crucial.

Um segundo aspecto relevante está relacionado a visão romântica que historicamente se tem do indígena. Se, por um lado, é necessário compreender o seu passado de escravidão e marginalização, por outro, também é preciso vencer a concepção do indianismo literário e político do século XIX, momento em que os povos indígenas foram divinizados, tornados vítimas e/ou heróis nos textos de José de Alencar, Castro Alves, Cruz e Souza, Jorge de Lima, entre outros. É crucial que, ao lecionar, o professor não caia na armadilha de conceituar o indianismo como elemento libertador, e sim como mais uma tentativa de apresentá-los como diferentes e inferiorizados perante os demais. No cenário dos Jê Meridionais, considerados os “últimos índios bravios”, também é imperativo que sua luta e resistência não sejam retratadas de forma dualista, romântica, hegemônica, categorizando-os igualmente entre vítimas e heróis. São agentes que têm papel na formação da sociedade, atuando nas suas transformações de forma efetiva. E, não somente no hoje, mas em todo o processo histórico. Cabe aos professores, portanto, inserir a história indígena na sua integralidade, apresentando o protagonismo do índio ao longo do tempo e não como parte de uma das várias subdivisões da História.

Todavia, no mesmo grau de importância, evidencia-se a necessidade de abordagem da condição atual dessas populações. Vive-se no presente um momento que pode ser derradeiro para o futuro dos indígenas no Brasil. Tratar da situação em que estes se encontram, das políticas de proteção e dos projetos para demarcação de suas terras, além de polêmicos, são assuntos imprescindíveis para a manutenção e respeito aos preceitos constitucionais. Quanto aos Jê, tal aspecto esta relacionado ao quarto e último tópico a ser aqui elencado: a ideia do “índio puro”. Isto é, a crença de que o índio para ser “índio de verdade” precisar estar isolado do restante da sociedade, vivendo de maneira selvagem, subsistindo unicamente dos recursos oferecidos pela natureza. Tal idealização dos povos autóctones impede o reconhecimento da sua indianidade e, por sua vez, prejudica o acesso à políticas públicas de proteção. Por outro lado, há também nesse sentido o reforço do preconceito, atribuindo aos índios miscigenados ou misturados improbidades por autodeclararem-se índios, pois, para essa perspectiva lèvistraussiana, o permanente contato destes com não índios e a incorporação de elementos ditos “brancos” no seu cotidiano, é motivo para subtrair-lhes direitos, sobretudo no âmbito da demarcação de terras.

É, presumivelmente, a dificuldade de compreender a existência do indígena no bojo da sociedade que os invisibiliza, acima de tudo os Jê Meridionais, que estão dispersos por um vasto território. Muitos morando em áreas urbanas, trabalhando de forma assalariada, mas que se entendem como índios. Na perspectiva histórica desse povo, tal invisibilidade é muito patente na historiografia do Contestado, uma vez que, em momento concomitante ao desenrolar do conflito, vários grupos Kaingang e Xokleng se fizeram numerosamente presentes por todo o território, mas pouco são relatados nos livros, geralmente inseridos no grupo que convencionou-se chamar de caboclos ou sertanejos. Destarte, é basilar pensar que formaram parcela relevante no movimento, lutando pela manutenção do seu espaço frente as imposições do poder governamental, dos coronéis e do capital estrangeiro. É importante, por conseguinte, que no ensino da Guerra do Contestado se dimensione a categoria caboclo como uma denominação abrangente, a qual congrega distintos grupos étnicos em uma única categorização, e que os indígenas a integram.

Cabe, por fim, salientar que o ensino da história indígena na educação formal é algo ainda em construção. Experiencia-se um momento em que os avanços conquistados na legislação não foram completamente implementados e que o risco de um retrocesso é lamentavelmente efetivo. Caberá não mais apenas ao Movimento Indígena lutar pela sua manutenção e ampliação, mas a toda sociedade, a qual somente terá plena consciência de seu verdadeiro papel nesse processo através do intermédio da educação. Pois, como bem disse Silva [1992, p. 62], “a estratificação do conhecimento escolar é ao mesmo tempo resultado e causa da estratificação social”.

Referências
Eloi Giovane Muchalovski é mestre em História pela UNICENTRO e membro do Grupo de Pesquisa “Entre Índios e Caboclos: [Etno]História, Cultura e Diacricidade entre coletivos indígenas invisibilizados na Região do Contestado” da UEL.

BRIGHENTI, Clovis Antonio. “Povos Indígenas em Santa Catarina” in: NOTZOLD, Ana Lúcia Vulfe; ROSA, Helena Alpini; BRINGMANN, Sandor [Orgs]. Etnohistória, História Indígena e Educação: contribuição para o debate. Porto Alegre: Palotti, 2012.
CUNHA, Manuela Carneiro da [Org.] História dos índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, Secretaria Municipal de Cultura, FAPESP, 1992.
D'ANGELIS, Wilmar da Rocha. “Para uma história dos índios do Oeste Catarinense” in Cadernos do Ceom, v.6, 1989.
MOTA, Lúcio Tadeu. “Passo Ruim 1868: as estratégias dos Xokleng nas fronteiras de seus territórios do Alto Rio Itajaí” in Revista Brasileira de História, v.37, n.75, 2017.
SANTOS, Silvio Coelho dos. Índios e bancos no sul do Brasil: a dramática experiência dos Xokleng. Porto Alegre: Movimento; Brasília: Minc/Pró-Memória/INL, 1987.
SILVA, Giovani José. “Todo dia é dia de índio” in Revista de História da Biblioteca Nacional, n.82, jul, 2012.
SILVA, Tadeu Tomaz da. O que produz e o que reproduz em educação: ensaios de sociologia da educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992.
TOMMASINO, Kimiye; FERNANDES, Ricardo Cid. Kaingang, 2001. Disponível em: https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Kaingang
WIIK, Flávio Braune. Xokleng, 1999. Disponível em:
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Xokleng


15 comentários:

  1. Gratidão pelo texto. Será de grande valia para a composição do quarto capítulo da minha tese. Em consonãncia com seu primeiro parágrafo constatei, por meio da pesquisa que estou realizando, que a história indigena "não existe" na maioria das salas de aula, na região Oeste de Santa Catarina.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Fico feliz se contribuí. Realmente há, assim como com vários outros temas da história do Brasil, uma deficiência muito grande no ensino da história e da cultura indígena, especialmente dos Jê Meridionais. Contudo, acredito que o ensino não só pode ser transformador como também é capaz de ser transformado. Pesquisas com a sua, por exemplo, certamente contribuirão par que um dia esse cenário se transforme.
      Obrigado pelo comentário!
      Eloi Giovane Muchalovski

      Excluir
  2. Boa noite Eloi. Em 2018 conclui uma pesquisa cientifica relativa ao Conflito do Contestado, tema esse que me desperta uma grande paixão em virtude do regionalismo. Mas enfim, o que me chama a atenção em sua fala, e considerando as várias leituras textuais e documentais para elaboração da referida pesquisa, não tinha me dado conta da invisibilidade dos índios e negros na historiografia do Contestado. É fato, em suma, os índios eram citados apenas como povos que habitavam o oeste catarinense, antes da formação dos caminhos das tropas (Tropeiros). E como você destacou que pesa sobre a invisibilidade dos índios, o fato de se tratar de "um povo ágrafo", podemos afirmar que a História Oral tem um papel imprescindível para desconstruir esse senso comum?

    Sérgio Mauro Nunes de Souza

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá, Sergio. Obrigado por seu comentário/questionamento. Certamente a história oral é um dos principais encaminhamentos para dar visibilidade aos índios do Contestado. E nesse aspecto, vejo que há uma eminente necessidade de aproximação dos métodos da História e da Antropologia em qualquer pesquisa que este tema. As técnicas etnográficas são uma das direções possíveis, uma vez que a legislação impõe (com o justo propósito de protegê-los) uma série de exigências para que se empreenda pesquisa em terras indígenas, e os estudos antropológicos já têm um caminho traçado nessa perspectiva. Além disso, existem ainda muitas fontes documentais a serem revistas – como o caso dos relatórios do exército em que o índio está englobado por outras designações – e outras ainda que não foram analisadas profundamente, como é o caso dos escritos do médico alemão Jorge Bleyer, o qual trabalhou na Brazil Railway Company.

      Um abraço.
      Eloi Giovane Muchalovski

      Excluir
  3. Bom dia Eloi, gratidão pelo texto. A oportunidade de conhecer mais etnias brasileiras por meio da pesquisa e enriquecedor. Diante dos embates do atual governo ao ensino de História, em especifico a temática indígena que foi pouco contemplada pela BNCC, quais os mecanismos podemos utilizar para que não haja retrocesso ao debate em sala de aula?
    Lucivaine Melo da Silva

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá Lucivaine, obrigado por interagir. Apesar da BNCC ainda necessitar de aprimoramentos, e ter concepções predominantemente eurocêntricas, acredito que houve avanços, especialmente quanto a promoção de habilidades que dizem respeito às relações étnico-raciais entre os jovens. Isso é importante reconhecer, mesmo que existam discursos de retrocesso pairando sobre a base curricular. Contudo, creio que ainda está nas mãos do professor a possibilidade de driblar essa deficiência, ao menos em sala de aula. Um dos mecanismos para isso emerge a partir do conceito do professor pesquisador, pois, apesar das insuficientes pesquisas no tema dos Jê Meridionais, por exemplo, elas existem e são acessíveis a todos os profissionais da educação. Eventos como este que estamos participando, bem como produções científicas, são produzidos com o objetivo de alcançar a sala de aula. Somos nós educadores que temos, ainda, a despeito dos projetos políticos em curso, a alternativa do avanço, o qual, acredito eu, baseia-se nos quatro aspectos que abordei no texto: vencer a barreira do preconceito, superar visão romântica sobre o indígena, implementar a abordagem da condição atual desses povos e vencer a ideia do índio puro.

      Eloi Giovane Muchalovski

      Excluir
    2. obrigada pela resposta. Este evento nos proporcionou a sair da zona de conforto na busca a compreensões frente as distintas pesquisas que tem contribuído em responder algumas inquietações que nos cercam e levarmos a novos posicionamentos quanto ao ensinar esta temática em sala de aula.
      Lucivaine Melo da Silva

      Excluir
  4. Parabéns pelo texto. Bem lembrada a obra História dos Índios no Brasil, de 1992, que considero um marco no que certa vez chamei de Novíssima História Indígena. Posto que tal compendio foi pioneiro numa abordagem histórica descolonizadora com um abrangente estudo dos povos indígenas na história da América e Brasil, de forma multidisciplinar, congregando inúmeras áreas do conhecimento, acessando muitos aspectos da história e cultura indígenas. A história indígena por iniciativa de uma grande antropóloga, Manuela Carneiro da Cunha. Portanto, lanço a seguinte questão: Por parte dos historiadores, por uma questão disciplinar, de produção de diferença e unidade do fazer histórico, há maiores dificuldades em manter uma intensa interdisciplinaridade com a Antropologia? Visto que as noções dos povos indígenas em sua diversidade, no que se refere as relações com o tempo, os entendimentos do que conceituamos História, aos indígenas são de outras ordens ontológicas e epistêmicas, de modo que se tenha uma definição complexa sobre uma história ser indígena de fato. Pois temos historiadores não-indígenas fazendo as ditas histórias indígenas e temos indígenas, formados na academia ou não, lideranças, anciões, caciques, xamãs, trabalhando suas histórias em variados espaços, entre eles, as escolas indígenas. Aspectos estes que o campo antropológico se debruça de longa data, prestando contribuições aos estudos históricos dos povos indígenas. Abraço.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Este comentário foi removido pelo autor.

      Excluir
    2. Boa tarde, Dhiogo. Grato por seu comentário. Acredito que os aportes metodológicos e teóricos aprimorados a partir dos Annales possibilitaram uma aproximação mais intensa da História com outros campos do conhecimento, como a Antropologia por exemplo. Temáticas como a alimentação, a sexualidade e o corpo, são expoentes dessa aproximação, a qual é de certa forma resultado de estudos interdisciplinares. No entanto, em tal percurso, vários foram os momentos de acirrado debate sobre os limites técnicos e epistemológicos das ciências vizinhas, como aqueles travados entre Durkheim e Marc Bloch, ou entre Lévi-Strauss e Braudel. Por outro lado, os debates em torno dos limites das diferentes ciências humanas e sociais, estimularam a produção de diversos trabalhos interdisciplinares, suprindo lacunas inseridas na intersecção das disciplinas. Nesse aspecto, pesquisas surgidas pelas trocas metodológicas da História com a Antropologia foram fecundas. Ccaso muito específico de John Monteiro, o qual tem influenciado trabalhos desde a década de 1990 ao evidenciar o protagonismo das populações indígenas na história. Portanto, acredito que o arcabouço teórico e metodológico hoje disponível entre as duas disciplinas, apesar de diferentes e importantes para demarcar seus campos de atuação, são totalmente passíveis de diálogo em trabalhos interdisciplinares, especialmente quanto a história indígena.
      Um abraço!
      Eloi Giovane Muchalovski

      Excluir
  5. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  6. Obrigado pelo texto. Vim por compartilhar dos mesmos ideais de escrita indígena. Estudo no meu Estado, Bahia, os indígenas do tronco Jê, os Maracás que viveram predominantemente na região central da Bahia. Compactuo das mesmas dificuldades em encontrar fontes que referenciem os indígenas daqui, torna-se muito difícil traçar um panorama com poucas fontes, inda mais com a visão do colonizador, pois as fontes nos dão informações do extermínio. Aqui os professores da região têm dificuldade em ter informações confiáveis sobre os nossos indígenas e os livros didáticos informa o índio genérico de exaltação da cultura tupi. Sem me alongar, farei minha pergunta referente ao texto. Você consegue correlacionar esse dualismo Kamé e Kairu com o dualismo maniqueísta do zoroastrismo? Até que ponto se parecem e onde se distanciam? Mais uma vez agradeço pelo texto.

    Antonio Marcos de Almeida Ribeiro
    macribial@yahoo.com.br

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Obrigado por seu comentário, Antonio. Não vejo uma relação entre o dualismo da sociocosmologia kaingang com o dualismo maniqueísta, seja do zoroastrismo ou da filosofia de Santo Agostinho. A relação entre Kamé e Kairu não é hierarquizada, opondo o bem e o mal, como de certa forma o maniqueísmo apresenta – apesar de que nem sempre o mal e mau e o bem é bom. A concepção dualista desses índios, em específico, é caracterizada muito mais como uma metodologia de organização e modelação da vida do que propriamente uma visão ou concepção religiosa. Portanto, apesar de parecerem análogos a primeira vista, não têm aproximação comparativa.
      Um abraço.
      Eloi Giovane Muchalovski

      Excluir

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.