QUILOMBOS E COMUNIDADES
REMANESCENTES QUILOMBOLAS NO PARANÁ: UMA ANÁLISE BIBLIOGRÁFICA
Tendo como foco bibliografias que versem
sobre Quilombos, busca-se aqui refletir sobre esse conceito, bem como observar
quais metodologias vem sendo adotadas para pensar essas comunidades no Estado
do Paraná e como o tema se relaciona com o ensino de história. A pesquisa é de
natureza bibliográfica, compreendida aqui enquanto um conjunto ordenado de
procedimentos e busca por soluções [Lima e Mioto, 2007] com a finalidade
social, pois decorre de razões intelectuais [Gil, 2008]. Pensada como uma forma
de trabalho capaz de colaborar para a construção dos mais variados
conhecimentos científicos.
“A pesquisa bibliográfica é desenvolvida a
partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos
científicos. Embora em quase todos os estudos seja exigido algum tipo de
trabalho desta natureza, há pesquisas desenvolvidas exclusivamente a partir de
fontes bibliográficas.” [Gil, 1994, p. 50].
Esta metodologia pode ser realizada através
de conexões digitais e contatos com obras escritas sobre o tema explorado.
Trata-se de reunir teorias em práticas dentro de um mesmo trabalho, “também é
indispensável nos estudos históricos” [Gil, 1994, p.51].
Nesta ótica, tais escritos apresentam algumas
produções bibliográficas que têm como ponto de partida a população
afrodescendente e os processos históricos que deram origem aos Quilombos no
Brasil, observando em especial comunidades quilombolas no Estado do Paraná.
Busca-se compreender e analisar qual é a demanda destes estudos, bem como o
nível de interesse por tais territórios enquanto campo investigativo e como
produções acadêmicas podem contribuir para o ensino de história.
Um
Estado tão negro quanto branco
Para Leite [1996, p.41] “A invisibilidade do
negro é um dos suportes da ideologia do branqueamento, podendo ser identificada
em diferentes tipos de práticas e representações.” A autora explica que a noção
de invisibilidade surgiu na literatura ficcional americana, tendo relação com o
racismo nos Estados Unidos e é marcada pela produção de um certo olhar que nega
a existência destes sujeitos. O negro é visto como não existente [Ellison, 1990
apud Leite, 1996]. No Brasil tal realidade afeta principalmente a região sul do
país, composta por Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, este último, o
ponto de partida das problematizações aqui propostas.
Em contrapartida, é pertinente afirmar que
não há como cogitar um Estado brasileiro isento a participação efetiva de
indivíduos negros nos mais variados setores socioeconômicos. Sobre isso Moura
[1993] situa que “Foi exatamente essa uniformidade da presença do escravo nas
diversas regiões do Brasil que proporcionou a continuidade da escravidão, sua
duração e a formação, em decorrência, de um modo de produção escravista entre
nós” [Moura,1993, p.8].
Logo, o repetitivo argumento de que há negros
no Paraná já se tornou um clichê acadêmico, mas essa contranarrativa se
consolidou como reflexo contestatório do que vinha a anos sendo ensinado nas
escolas, sobretudo no ensino de história, que de modo secular deu base para
(re)produção de interesses das culturas hegemônicas, o que levou a uma série de
revisionismo histórico que marcou a contemporaneidade na medida em que
“O Ensino de História, desde a promulgação da
Lei nº 10.639/2003 e, por conseguinte, desde a alteração da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação, demanda, portanto, uma reconfiguração das perspectivas
segundo as quais a História do Brasil vem sendo percebida.” [Coelho; Coelho,
2018, p.11].
Embora muitos livros didáticos não mencionem,
desde 1853, ano de emancipação da antiga comarca de Curitiba e constituição de
um Estado paranaense, a região do primeiro planalto do país fora habitada por
pretos e pardos, haja visto que o processo escravista não se limitou apenas aos
Estados do nordeste e sudeste, como muitos insistem em afirmar. A prova disso é
a expressiva quantidade de estudos e pesquisas recentes que tratam da efetiva
presença negra no sul do Brasil desde os primeiros ciclos econômicos nacionais
até a contemporaneidade. Tal presença deu origem a clubes negros, organizações
religiosas e outras formas de sociabilidades que tinham como protagonistas
sujeitos recém-libertos.
A região sul do Brasil conta com cerca de 22%
de afrodescendentes que se autodeclaram pretos e pardos [IBGE, 2015] e dentre
os três Estados que a compõe. Com base na Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD) o Paraná, enquanto o Estado “mais negro” dos três, conta com
11,2 milhões de habitantes, mais de 31% correspondem a cidadãos negros, dados
que desestabilizam uma série de discursos que minimizam a presença negra no
Estado e que exaltam a colonialidade, compreendida aqui como, “[...] um dos
elementos constitutivos e específicos do padrão mundial do poder capitalista.
Sustenta-se na imposição de uma classificação racial/étnica da população do
mundo como pedra angular do referido padrão de poder (...)”. [Quijano, 2009, p.
72].
A quantidade expressiva de sujeitos pretos e
pardos em terras paranaenses justifica a existência de clubes negros em seus
limites citadinos, dois fundados no fim do século XIX e os outros quatro
datados do século XX. Além dos clubes negros, o Paraná conta com uma série de
comunidades remanescentes quilombolas que lutam para serem reconhecidas em meio
a um cenário político tão instável.
Quilombos
e Identidades
Antes de trazer discussões a respeito do
processo de constituição dos Quilombos é importante frisar que “Essas
comunidades de ex-escravos organizavam-se de diversas formas e tinham
proporções e duração muito diferentes. Havia os pequenos Quilombos compostos de
oito homens ou pouco mais. ”[Moura, 1993, p.12]. Sobre isso, Clóvis Moura
pontua que tais organizações eram praticamente grupos armados fugindo do
cativeiro e alguns eram recapturados pelos capitães-do-mato, figura
emblemática, por sinal, que gera opiniões contraditórias, por vezes
anacrônicas, até os dias atuais.
No Brasil o quilombo marcou presença durante
todo o período escravista e existiu praticamente em toda a extensão do
território nacional “À medida que o escravismo aparecia e se espraiava
nacionalmente, a sua negação também surgia como sintoma da antinomia básica
desse tipo de sociedade.” [Moura, 1993, p.14].
Embora seja parte constituinte da narrativa
histórica brasileira, tal assunto é pouco explorado na educação básica, por
exemplo, e quando tratado, se limita ao Quilombo de Palmares. Geralmente o
assunto é abordado em novembro, no dia da consciência negra como cumprimento de
currículo e protocolos voltados para a lei 10.639/2003 que trata da
obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira nas escolas.
“A demanda pelo ensino de conteúdos
específicos – nesse caso, o ensino de história e cultura afro-brasileira –
requer uma tradução pela ação docente em história, não somente pela sua
introdução no currículo escolar, mas sobretudo por uma recomposição de
concepções de história – a partir de então pautadas pela revisão das abordagens
chamadas eurocêntricas e colonialistas.” [Pereira, 2008, p.24].
Em
vista disso incorre na importância de olhar para o potencial formativo do
ensino de história como responsável pela inflexão de paradigmas e estereótipos
que fragilizam as identidades negras, bem como suas culturas. Sobre a cultura
popular negra, Stuart Hall explana que é o local de contestação estratégica e
se é uma boa cultura popular negra, dever-se-á passar pelo teste de
autenticidade [Hall, 2003, p.341]. Nessa perspectiva,
“[...] ela nunca pode ser simplificada ou
explicada nos termos das simples oposições binárias habitualmente usadas para
mapeá-la: alto ou baixo, resistência versus cooptação, autentico versus
inautêntico, experiencial versus formal, oposição versus homogeneização. Sempre
existem posições a serem conquistadas na cultura popular, mas nenhuma luta consegue
capturar a própria cultura popular para o nosso lado ou o deles.” [HALL, 2003,
p. 341-342].
Outro equívoco é acreditar em identidade
negra como uma grande categoria universal que se constituiu de modo harmônico,
estanque e linear. Tais indagações partem do pressuposto de que “[...] a
identidade negra é atravessada por outras identidades, inclusive de gênero e
orientação sexual. A política identitária essencialista aponta para algo pelo
qual vale lutar, mas não resulta simplesmente em libertação da dominação.”
[Sovik, 2003, p.12]. Nesta esteira, há inúmeras lutas por reconhecimento social
que só fazem sentido dentro do viés identitário, elemento essencial para a
emancipação de um grupo considerado historicamente como minoritário.
Nessa linha, tem-se aqui as comunidades
remanescentes quilombolas paranaenses como agentes identitários e produtores de
culturas. Tais organizações negras de existência e resistência são patrimônios
culturais nacionais, porém, grande parte da população não (re) conhece suas existências.
Por isso a importância de articular, não só a lei 10.639/2003 com o ensino de
história, mas promover diálogos com dissertações e teses que problematizem
esses espaços de identificações e lutas, “Diante disto, para possibilitar uma
alternativa na compreensão do processo histórico, o ensino de História precisa
deixar de ser tradicional e incorporar outras fontes de informações.”
[Ferreira, 2008, p.3], pode-se começar destacando o signo quilombo, que segundo
o antropólogo Kabengele Munaga no Brasil correspondem a “ [...] uma cópia do
quilombo africano reconstituído pelos escravizados para se opor a uma estrutura
escravocrata, pela implantação de uma outra estrutura política na qual se
encontravam todos os oprimidos”. [Munanga, 1995/6, apud Leite, 2000, p.336].
Já Clóvis Moura [1993, p.13] explica que os
Quilombos “manifestavam-se nacionalmente como afirmação de luta contra o
escravismo e as condições em que os escravos viviam pessoalmente.” Para o autor
a quilombagem foi apenas uma das formas de resistência, sobre isso pode-se
citar as próprias revoltas encabeçadas por sujeitos negros e que emergiram
praticamente em todo o território brasileiro ao longo do período escravista.
Deste modo, é possível situar que a palavra
Quilombo perpassa a questão de espaço ou agrupamento de sujeitos fugitivos que
buscavam um refúgio, é na verdade a marca de uma sociedade organizada que viu
no regime escravagista a necessidade de reagir. Neste caso a fuga pode sim ser
compreendida como uma forma resposta ao tratamento ofensivo, violento e de
dominação, e a criação de abrigos, grupos e mocambos foi o resultado do
descontentamento da população cativa que partiu em direção a outras condições
de sobrevivência.
E a fim de direcionar os olhares para a
região Sul, iniciar-se-á situando que o Estado Paraná conta com 34 comunidades
quilombolas, segundo o último relatório da fundação palmares [Palmares, 2012],
porém no relatório do Grupo de Trabalho Clóvis Moura há ainda mais 20
comunidades não certificadas e pelo menos mais 32 comunidades que carecem de
visita dos órgãos oficiais, a fim de serem reconhecidas [GTCM, 2010].
Sobre o reconhecimento desses territórios com
origens diversas, Priori [2012] explica que ocorreu com a promulgação da
constituição federal de 1988 e em 2001 foi conferido ao Ministério da Cultura à
função de identificar, delimitar, demarcar e titular as terras quilombolas no
Estado e assim foi feito.
Análises
No anseio de conhecer algumas metodologias
que podem vir a corroborar para dar corpus a pesquisas que tenham comunidades
remanescentes quilombolas como sujeitos de pesquisas, o campo de investigação
aqui explorado refere-se ao sítio eletrônico da Biblioteca Digital Brasileira
de Teses e Dissertações (BDTD) e a busca ocorreu através de palavras-chaves
Quilombos e Paraná. A priori o sistema encontrou vinte e uma produções, mas
apenas três serão apresentadas aqui, sendo duas dissertações e uma tese.
A primeira produção lida foi a tese de
doutorado de Lúcia Mara de Lima Padilha, orientada pela Professora Doutora
Maria Isabel Moura Nascimento, sendo defendida no ano de 2016 pelo Programa de
Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), na
área de concentração História e Políticas Educacionais.
Em uma tese de 174 páginas intitulada de A
(In) Existência de um Projeto Educacional para os Negros Quilombolas no Paraná:
Do Império a República a autora buscou compreender o contexto histórico o qual
os negros foram escravizados, bem como a formação dos Quilombos no Paraná como
um movimento antagônico a escravidão e identificar a (in) existência de um
projeto educacional para os sujeitos negros no Estado [Padilha, 2016].
A autora trabalha com categorias de análises
e como proposta teórico-metodológica utilizou o Materialismo Histórico e dialético
em uma pesquisa de cunho bibliográfica e documental. Sobre a sistematização da
construção das análises a pesquisadora inicia com uma revisão bibliográfica e
na sequência faz uma pesquisa documental, além do levantamento de fontes sobre
a população negra e a educação no Estado do Paraná.
Através do Materialismo Histórico e
Dialético, Padilha [2016] tenta compreender seus objetos de estudos/fontes a
partir das condições materiais de existência dos homens. Sobre a escolha deste
paradigma, traz os seguintes argumentos:
“Analisar a forma como se deu a (in)
existência de um projeto educacional para os negros no Paraná no final do
século XIX e início do século XX pressupõe uma pesquisa dialética, que
contemple as condições econômicas, políticas e sociais presentes na sociedade
brasileira da época.” [Padilha, 2016, p. 22].
Além desta problematização a pesquisadora
realizou um levantamento de teses e dissertações produzidas no Brasil até o mês
de outubro de 2015 e construiu uma tabela com os seguintes dados: Autor,
Título, Local/Área e Ano. Tal levantamento fez com que Padilha (2016)
concluísse o seguinte: Pesquisas que tratem da temática escravidão no Brasil
não são recentes, informação crucial para pensar a epistemologia “negra”
nacional.
O segundo trabalho encontrado no acervo
digital da BDTD corresponde a uma Dissertação de Mestrado do Programa de
Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC). Rafael Palermo Buti desenvolveu sua pesquisa sob a orientação da Professora
e Doutora Miriam Furtado Hartung. Com 196 laudas a pesquisa foi defendida em
2009 e tem como título A-cerca do pertencimento: percursos da comunidade
Invernada Paiol de Telha em um contexto de reivindicação de terras.
Os escritos de Buti [2009] tiveram como
proposta problematizar as estratégias utilizadas pela Comunidade Invernada
Paiol de Telha na luta por reaver as terras que eram de seus ascendentes. Nesta
perspectiva o autor utiliza uma metodologia que situa o antropólogo enquanto
autor e sujeito observador, participante e produtor de imagens e representações
acerca de da dinâmica em que se inseriu. A textualização das realidades é um
aspecto significativo destas análises.
Buti [2009] apresenta uma análise com
aspectos etnográficos, pois suas problematizações trazem um movimento dialético
entre interpretação e experiência que possibilitam reflexões muito precisas
acerca das estratégias políticas que os integrantes da Comunidade Invernada
Paiol de Telha utilizam para atingir seus objetivos.
O pesquisador realizou sete visitas a
comunidade entre 2007 e 2008 enquanto integrante de uma equipe que elaborava um
relatório que visava reconstruir os aspectos principais das vivências dos
sujeitos que povoavam as chamadas terras do Fundão, região que corresponde às
terras do Paiol de Telha. Buti [2009] relata que em 2008 dirigiu-se a
Guarapuava, município em que grande parte dos requerentes das terras da
Invernada reside e lá passou dez dias na residência de uma senhora que o
recebeu.
Enquanto esteve inserido na dinâmica desta
comunidade em Guarapuava o pesquisador consultou o acervo documental do local
denominado de Central de Apoio ao Campesinato - Antônio Tavares Pereira
(CEMPO-PR) e participou das reuniões entre os membros da comunidade e Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).
Ainda sobre a sistematização do trabalho de
Buti [2009], este fez anotações sobre as possibilidades de lutas jurídicas e
políticas em relação à comunidade aqui referida e seu entorno. O autor realizou
também análises que evidenciam o processo de enunciação através de determinadas
palavras em sua pesquisa, o que demarca uma perspectiva dialógica significativa
na forma de interpretar as experiências dos entrevistados.
A terceira obra mencionada no acervo digital
da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) tem como
título: Trajetórias, lugares e encruzilhadas na construção da política de
educação escolar Quilombola no Paraná no início do III milênio. Publicada no
ano de 2012 tal produção corresponde a uma dissertação de mestrado do Programa
de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná (UFPR) de
autoria de Cassius Marcelus Cruz e sob a orientação da Professora e Doutora
Tania Maria Baibich.
O trabalho de Cruz [2012] busca abordar como
acontecem as reformulações no processo
de elaboração da Proposta Pedagógica Escola Quilombola e Etnodesenvolvimento no
Paraná, e a fim de compreender este movimento o autor analisa os elementos que
caracterizaram o ciclo vital das políticas públicas de educação escolar
quilombola durante o período de 2003 a 2010 e faz isso através de pesquisas que
tratam de fontes orais e escritas, referência a atas de reuniões, questionários
mistos e documentos variados.
O pesquisador procura construir uma narrativa
capaz de expor e sistematizar os processos históricos da educação escolar e
quilombola no Estado. Para isso utiliza a recuperação e análise de um apanhado
de fontes escritas e orais organizadas através de inserções institucionais e
militância, ações observadas após 24 viagens aos territórios quilombolas do
Paraná, totalizando 98 dias de trabalhos nestas comunidades [Cruz, 2012].
Dentro de uma perspectiva
teórico-metodológica que reconhece o “[...] difícil e complexo exercício de
estranhar-se e afastar-se do seu próprio fazer e do fazer daqueles que estão
envolvidos com a questão, para assumir a posição inconformista daquele que quer
conhecer um pouco mais.” [Amaral, 2010, apud Cruz, 2012, p. 25] o autor se
coloca como um agente anímico e organicamente implicado com o próprio objeto,
bem como a elaboração das fontes problematizadas [Cruz, 2012].
Além de visitar as comunidades quilombolas do
Paraná o pesquisador participou ao longo de quatro anos de uma série de
reuniões, eventos e sessões institucionais que envolvia a Educação Escolar
Quilombola em âmbito estadual. Tal envolvimento fez Cruz [2012] sistematizar o
conjunto de fontes orais e escritas que reuniu e realizar uma análise pautada
em esferas institucionais. O autor sistematizou suas fontes de acordo com o
espaço institucional em que as mesmas foram constituídas, tal metodologia se
assemelha com a criação de categorias de análise presente nos escritos de
[Padilha, 2016], citados anteriormente.
Considerações
finais
Após apresentar o conceito de Quilombo como
um lugar de resistência negra que se constituiu enquanto uma resposta a
dinâmica social vigente, conclui-se esta reflexão considerando a relevância de
pensar não só as transformações sócio-históricas desses territórios negros no
tempo e no espaço, mas ainda o modo de representação destes na
contemporaneidade, que dialoga com a necessidade do ensino de história como
agente de desconstruções de narrativas excludentes, que tem em mãos o poder de
dar visibilidade a tais espaços por meio de problematizações interdisciplinares
e dialógicas. Quanto à leitura das obras acadêmicas citadas, observando a
especificidade de cada pesquisa, entende-se que não há sistematizações, fontes
ou métodos que independem da sensibilidade dos pesquisadores, materiais disponíveis
e intencionalidade de pesquisa.
Referências
Merylin Ricieli dos Santos é Doutoranda em
História pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), Mestre em
Linguagem, Identidade e Subjetividade (UEPG) e bolsista da Fundação de Amparo à
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merylinricisantos@gmail.com
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Olá Merylin,
ResponderExcluirParabéns pelo trabalho. Ao revisitar os trabalhos mencionados, você contribuiu para reforçar a necessidade da temática abordada integrar discussões para a valorização da população e cultura negra, caminho esse significativo para combater diferentes tipos de violências e exclusões sociais.
Minha questão consiste apenas para "conversarmos".
Por ser da região de Guarapuava, você encontrou outros trabalhos sobre o Paiol de Telhas? Esse é um tema que há alguns anos realizei algumas leituras, pesquisas..... possuo um dossiê (cópia) que reuni vários documentos (cartório, jornais, outros) utilizados para o processo de reconhecimento da terra. Caso tenha interesse, podemos trocar algumas informações.
Outra questão, diante de uma sociedade racista, (que também não identifica e nega a existência do racismo) e que vive em constante tentativa de revisionismo histórico como uma recusa desses debates, como podemos construir outras formas, espaços, lugares para educar? (principalmente esse povo rsrs) Além da sala de aula, quais as outras possibilidades? É possível utilizar o Club 13 de maio, por exemplo, como uma forma de educar contra o racismo?
Ótima pesquisa.
abraço
Jorge
Olá Jorge, boa noite!
ExcluirPrimeiramente obrigada pela leitura primorosa do meu texto.
Respondendo sua primeira questão, pontuo que sim. Há uma série de pesquisas de diferentes áreas que abordaram a temática, entretanto, infelizmente não consegui realizar a leitura de todas a tempo de submeter o texto. Caso tenha interesse em aprofundar as discussões sobre tal comunidade, lhe indico a dissertação denominada “A Invernada Paiol de Telha e a Nova Legislação Quilombola” defendida em 2016 no PPGH-UEPG pela Adriana Ribas Adriano Cararo. Outro texto que poderia te indicar refere-se a breve produção do Professor Delton Aparecido Felipe, que trata da Comunidade Quilombola Paiol de Telha na perspectiva do patrimônio cultural e lugar de memória. O texto denominado “4 Comunidades quilombolas no Paraná” de Angelo Priori (et.al) também me auxiliou a compreender a extensão desses Territórios Negros no Estado, os autores trazem desde as comunidades quilombolas reconhecidas pela Fundação Palmares até o número de famílias e habitantes das comunidades identificadas, de acordo com cada cidade. Clayton Silva (2014) publicou o artigo “Compartimentos quilombolas e a luta por direitos no estado do Paraná (Brasil)” que pode ser um ponto de partida para sua busca. Por fim, o livro “Terra e Cidadania – Terras e Territórios Quilombolas” (2008) constituído por relatórios e levantamentos realizados pelo Grupo de Trabalho Clóvis Moura (GTCM). Quanto a oferta do compartilhamento de suas fontes, muito me interessa e agradeço prontamente. Sobre as demais perguntas, na prática, acho um grande desafio pensar nessas questões em um cenário político tão instável, entretanto, necessário. Penso que podemos construir outras formas, espaços e lugares para educar partindo do pressuposto de uma educação decolonial e que reconheça as diversidades de modo multifacetado. Pode-se iniciar compreendendo a necessidade de uma mudança estrutural do sistema como um todo, valorizando culturas anônimas, reconhecendo terras quilombolas, revendo políticas de patrimonialização, respeitando os indígenas, mudando o vocabulário costumeiro, restruturando currículos escolares, sobretudo assumindo que o racismo institucional afeta o futuro de meninos e meninas negras que são a única esperança para quebrar a cultura geracional do genocídio da população negra no Brasil. E as salas de aulas são espaços chave nessa desconstrução, todavia, devem estar conectadas com realidades externas a fim de contribuir não só na forma, mas no conteúdo. Quando a possibilidade de usar o Clube Treze de Maio (meu objeto de pesquisa) como uma maneira de educar contra o racismo, certamente é uma alternativa. Poderíamos começar na esteira da própria educação patrimonial, perpassar pela história da população negra local, até chegar a construção da contranarrativa de uma cidade exclusivamente branca, por exemplo.
Espero ter respondido, obrigada mais uma vez, grande abraço.
Olá Merylin,
Excluiragradecido pelo retorno. Considere respondido todos os questionamento. Além das reflexões do texto, obrigado pelo tempo dedicado para responder, as argumentações foram ótimas. Complemento com #fogonosracistas (rsrs) O assunto é de extrema e importância e merece ser debatido em todos os espaços. Conversamos com tempo para maiores informações sobre a fonte. Forte abraço.
Jorge Luiz Zaluski
Eu que agradeço, Jorge!
ExcluirManteremos contato.
Grande abraço.
#fogonosracistas
Parabéns pelo desenvolvimento da pesquisa. É de extrema importância que este leque bibliográfico passe a capacitar cada vez mais os materiais escolares. Primeiro gostaria de saber se sua pesquisa tem como objetivo o trabalho de campo com estas comunidades e obter relatos orais. Outro ponto s trata de uma comunidade Quilombola presente no município de São Miguel do Iguaçu no Oeste do Paraná, pouco vislumbrada na região e quase silenciada no âmbito escolar regional. Há menção na sua pesquisa há esta comunidade? Obrigado por compartilhar e parabéns pelo trabalho.
ResponderExcluirRudy Nick Vencatto
Olá Rudy Nick, obrigada por ler meu texto e dispor do seu tempo para comentá-lo. Respondendo sua pergunta, digo que, infelizmente, não tenho como objetivo o trabalho de campo com essas comunidades, pois pesquiso Territórios Negros urbanos, mas não descarto a possibilidade de trabalhar com a História Oral nas comunidades remanescentes quilombolas de minha cidade natal, Ponta Grossa (PR), que conta com a Comunidade Remanescente Quilombola da Colônia Sutil e a Comunidade Remanescente Quilombola da Colônia Santa Cruz. Quanto a comunidade que mencionou, presente no município de São Miguel do Iguaçu (PR), se for a Apepu, eu sei de sua existência, mas muito pouco de sua história, na realidade só li o trabalho de Solange Portz, Valdirene Reimann Decurgez e do Paulo Renato da Silva (2017) denominado “O Quilombo Apepu: Memória e Representação de uma Comunidade”. Li também um relatório do Grupo de Trabalho Clóvis Moura que trazia o número de famílias que a constituíam, bem como seus números de habitantes, mas no geral, possuo um raso conhecimento sobre esta, visto que meus objetos, comunidades e sujeitos de pesquisas sempre se condensaram na região dos Campos Gerais do Estado. De qualquer forma, vou procurar mais informações sobre ela a fim de entender suas especificidades e fazer conexões com minhas comunidades de estudos. Obrigada pela indicação.
ExcluirAgradeço mais uma vez pelo seu comentário e disposição em ler o texto.
Abraço.
Em primeiro lugar gostaria de parabenizar pela produção do artigo. Considero uma pesquisa pertinente para o contexto educacional e historiográfico.
ResponderExcluirDesta forma, humildemente faço um questionamento e ao mesmo tempo uma sugestão, no que refere ao conceito de Quilombo, a partir da leitura do autor Clóvis Moura (1993), onde fala que os Quilombos “manifestavam-se nacionalmente como afirmação de luta contra o escravismo e as condições em que os escravos viviam pessoalmente”. O autor possui uma leitura interessante e significativa a respeito do conceito de Quilombo, como um espaço de resistência, porém um conceito preso no tempo da escravidão.
Para Véronique Boyer, em “A construção do objeto Quilombo” de 2009, chama atenção, ao falar que o conceito de Quilombo necessita ser “desempoeirada” e “re-semantizada”, descontruir a ideia de estrutura rural, de resistência à sociedade escravagista, essa noção histórica do lugar de fuga deve ser superada por meio de pesquisas, “a fim de transformá-la em um conceito pertinente para apreender a realidade de novas formas de mobilização política onde as questões fundiárias são centrais” (Boyer, 2009, p.133).
Ao tratar de Quilombos do Estado do Paraná nos tempos atuais, não é necessário dialogar com outros autores, além do Clóvis Moura, para conceituar e resinificar o quilombo? Desta forma, abordar com maior precisão o conceito.
Entendo que são algumas informações relevantes. Agradeço a oportunidade de ler esse importante trabalho de pesquisa. Mais uma vez, parabenizar pela pesquisa apresentada.
Atenciosamente
Ketno Lucas Santiago
Mestre em Linguagens e Saberes da Amazônia - UFPA
Olá, Ketno Lucas. Obrigada pelos questionamentos e comentários.
ExcluirCompreendo as especificidades e principalmente as transformações temporais que (re)significam o termo, visto que venho problematizando tais espaços enquanto Territórios Negros (Raquel Rolnik, 2014; Daniele Vieira, 2018; Azânia Mahin Romão Nogueira, 2018). Eu não conhecia a bibliografia que trouxestes, mas tenho outras leituras sobre o conceito (Flávio dos Santos Gomes, 2015; Lilia Schwarcz, (1999); Nei Lopes, 2006; Alessandra Schmitt, 2002), entretanto, infelizmente, não consegui inserir tudo em um texto de três mil palavras. Lerei com atenção o texto que indicastes e tenho certeza que irá me acrescentar em vários aspectos.
Obrigada mais uma vez, abraço.
Meu parabéns pelo texto! Infelizmente, mitos e deturpações históricas utilizados pela ideologia paranista ainda são difundidas pela política educacional do Estado, onde obras, tanto de Romário Martins quanto de Wilson Martins ainda continuam presentes nas escolas paranaenses, sendo até mesmo consideradas como referencias para a história regional, onde os africanos são excluídos da representação da identidade paranaense, sendo desprezado, enquanto o imigrante branco europeu é enaltacido. Hoje os estudos acadêmicos demonstram a significativa presença de africanos escravizados nos ciclos economicos do estado, refutanto os escritos de Romário Martins e Wilson Martins. Cabe o professor instrumentalizar essas pesquisas para aplicabilidade na eduação básica no ensino de história. Você citou Mirian Hartung como orientadora de um autor de dissertação de mestrado. Lembrei-me de uma artigo dela que li recentemente intitulado "Muito além do céu:escravidão e estratégias de liberdade no Paraná do século XIX". Se não o leu, recomendo a leitura. A autora problematiza a escravidão no Brasil, particularmente no Paraná, embasada em uma gama de documentos que inclui certidões de nascimento, casamento, obitos, inventários e títulos de posse. Seu texto traz à tona uma complexidade existente dentro das relações entre senhores e escravos para além do aspecto econômico.
ResponderExcluirTainá Guanini de Oliveira
Boa noite, Tainá.
ExcluirGrata pela leitura do texto e comentários.
Minhas reflexões vão ao encontro das suas no tocante da brancura atribuída a história paranaense. Sobre a bibliografia mencionada, eu tive a chance de ler esse texto, bem como a oportunidade de trabalhar na Comunidade Remanescente Quilombola da Colônia Sutil, território sobre o qual a autora Miriam Furtado Hartung (2000) desenvolveu sua pesquisa de doutoramento denominada “A Comunidade Sutil: História e etnografia de um grupo negro na área rural do Paraná” e se não me falha memória, o texto que você indicou é um recorte da tese dela e realmente é muito interessante e preciso, visto que há um diálogos muito reflexivo com as fontes apresentadas.
Obrigada pela sugestão e colocações.
Abraço.